Revista Retratos
Tradição e modernidade no cafezinho do dia a dia
24/05/2018 14h00 | Atualizado em 16/05/2019 10h52
Num dos restaurantes mais antigos do centro do Rio de Janeiro, os garçons – alguns com mais de 20 anos de casa e conhecidos pelo nome – retiram os pratos e talheres após o almoço. Lá, ainda é possível pedir como manda a tradição: “um cafezinho e a conta, por favor” e receber à mesa as xícaras aquecidas, um bule de inox repleto de um bom café coado e, para arrematar, um potinho de creme batido.
A cortesia é uma verdadeira relíquia, em tempos modernos de café espresso pago à parte. “É verdade, o café espresso tomou um grande espaço no mercado brasileiro”, explica a pesquisadora com pós-doutorado em neurociência do café, Silvia Oigman. “Mas a tendência é que os cafés coados voltem com uma cara nova, através de monodoses (coados individualmente)”.
Além de objeto de estudo, o café também é um hobby na vida de Silvia, que se tornou barista (especialista em preparar e servir cafés). “Procuro ter entendimento de tudo que envolve café, desde o momento em que é cultivado até o momento em que é consumido. Esse know-how me ajuda no meu dia a dia como cientista”, conta.
A paixão de Silvia pelo café parece ser um sentimento compartilhado pelos brasileiros em geral. Em 2008, por exemplo, cada residência do país comprou, em média, 2,6 kg de café por morador. A informação faz parte da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que está em campo para coletar dados atualizados sobre o consumo das famílias. Já o Observatório do Café, coordenado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), mostra que o consumo interno de café no Brasil, em 2017, foi de 21,5 milhões de sacas de 60 kg. Com esse volume, o país atingiu a segunda colocação no ranking do consumo mundial da bebida, perdendo apenas para os Estados Unidos, que consomem 25,8 milhões de sacas de café ao ano.
Aroma da felicidade
Talvez nenhum outro produto seja capaz de contar a história econômica e social do Brasil tão bem quanto o café. Pela cultura do café, passam o fortalecimento da aristocracia brasileira, os sofrimentos advindos da escravidão, o crescimento do comércio exterior e a própria industrialização do país.
Confirmando a força do café na agricultura, o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA) estimou, em fevereiro, um crescimento de 14,6% em sua produção para 2018, chegando a 3,2 milhões de toneladas ou 53 milhões de sacas de 60 kg.
O aumento é explicado por uma característica do café arábica (espécie cultivada em altitudes acima de 700 metros) chamada bienalidade, em que a planta atinge a melhor produtividade apenas de dois em dois anos. “Essa característica é do café plantado principalmente em Minas Gerais. Esse ano, a bienalidade do café é positiva”, explica o analista da coordenação de Agricultura do IBGE, Carlos Antonio Barradas.
Com a produção nacional do grão garantida, o prazer de saborear aquele cafezinho pode continuar sendo um hábito saudável na vida dos brasileiros. Estudos de neurociência mostram que o aroma do café ativa o sistema de recompensa no cérebro. “Ele ativa regiões de prazer no cérebro, da mesma forma que o amor, as drogas e músicas agradáveis. Apenas sentir o cheiro do café já é suficiente para nos trazer muitos benefícios”, explica Silvia.
Leia mais sobre o assunto na Retratos nº 11.