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Censo 2022

IBGE divulga retrato inédito sobre quilombolas e ressalta modelo de consulta às lideranças dessa população

Editoria: IBGE | Carmen Nery

28/07/2023 17h51 | Atualizado em 24/08/2023 10h02

Cimar Azeredo abriu a apresentação dos dados sobre levantamento inédito da população Quilombola - Foto: Washington Costa/MPO

O IBGE divulgou nesta quinta-feira, 27, os primeiros resultados sobre o número de quilombolas no Brasil e dados sobre seus domicílios. O levantamento inédito foi saudado como um resgate histórico por autoridades e sobretudo pelas várias lideranças quilombolas presentes ao evento, que reuniu mais de 120 pessoas no Auditório da sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), em Brasília.

A divulgação de que o país tem 1.327.802 pessoas, ou 0,65% do total de habitantes, foi destaque nos principais veículos de imprensa nacional e até do exterior, com matérias publicadas pelo jornal britânico The Guardian e a emissora BBC.

O presidente interino do IBGE, Cimar Azeredo, ressaltou que, com esses dados, o Instituto cumpre a sua missão de retratar o Brasil. Para ele, o principal benefício de se ter um levantamento inédito sobre a população quilombola é que a partir de agora poderão ser elaboradas políticas públicas baseadas em evidências, e não em narrativas.

“Hoje colocamos os quilombolas no mapa e depois vamos colocar os indígenas e os moradores de favela no mapa. Esse é um ponto importante, porque são as populações que precisam mais dessas estatísticas. Precisamos saber quantas escolas, quantos postos de saúde, tudo que essas populações precisam. O que está acontecendo é uma reparação histórica. Vimos os quilombolas se identificando e se enxergando no Censo 2022. Isso traz muito orgulho para o IBGE”, ressaltou Azeredo.

Veja os primeiros resultados do Censo para a população quilombola

Brasil tem 1,3 milhão de quilombolas em 1.696 municípios

Para a responsável pelo Projeto de Povos e Comunidades Tradicionais do IBGE, Marta Antunes, o Censo da população quilombola representa um marco na história dos censos demográficos. Pela primeira vez, o IBGE conseguiu incluir um grupo populacional que, desde a Constituição de 1988, reivindica a sua representação nas estatísticas oficiais, na cartografia e na geografia.

“A invisibilidade da população quilombola, tanto nos dados quanto nos mapas, foi suprida por um censo abrangente, inédito e confiável. Poder coordenar esse trabalho junto com meu colega Fernando Damasco, gerente de Territórios Tradicionais e Áreas Protegidas, foi uma oportunidade única de colocar nossa formação, eu como antropóloga, ele como geógrafo, para fazer essa tradução entre a dureza da estatística pública e as necessidades de representação de um grupo étnico diferenciado que demanda um olhar para modos de organização, de estar e viver diferenciados, atendendo ao rigor técnico da produção do IBGE”.

Ela afirmou também que as estatísticas oficiais inauguram um novo capítulo para a população quilombola. “Superando o imaginário de resquícios de um passado distante, o IBGE atualiza o conhecimento sobre a presença dos quilombolas no Brasil de hoje, permitindo ao Brasil conhecer o Brasil quilombola”, disse Antunes.

“Esses resultados só foram possíveis porque realizamos um detalhado e abrangente mapeamento das localidades quilombolas existentes no Brasil. Embora já existissem estudos, trabalhos acadêmicos e registros administrativos que forneciam indicações resumidas sobre a localização das comunidades, nenhum outro mapeamento foi capaz de informar com padronização metodológica, detalhamento geográfico e abrangência nacional a distribuição dos quilombolas no território nacional”, disse o gerente de Territórios Tradicionais e Áreas Protegidas, Fernando Damasco.

Ele explicou a metodologia inédita desenvolvida pelo IBGE em parceria com a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas). “O método foi baseado na identificação dos quilombos de hoje, que produzem e organizam seus territórios, e, para isso, a cartografia participativa, acompanhada e validada pelas lideranças comunitárias, foi fundamental”, explicou Damasco.

Cimar Azeredo abre o evento de divulgação de dados inéditos da população quilombola - Foto: Washington Costa/MPO
O chefe da Assessoria Especial do Ministério do Planejamento, João Villaverde - Foto: Washington Costa/MPO
O chefe da Assessoria Especial do Ministério do Planejamento, João Villaverde destaca o papel estratégico do IBGE para o país - Foto: Washington Costa/MPO
Dandara Mendes, recenseadora quilombola contou a importância de fazer o censo em seu quilombo - Foto: Washington Costa/MPO
Marta Antunes e Fernando Damasco com lideranças quilombolas e o mapa das comunidades - Foto: Washington Costa/MPO

Entre as autoridades presentes, pelo Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO), estava o chefe da Assessoria Especial, João Villaverde, e o chefe da assessoria de Participação Social, Anderson Oliveira Quack. Pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, esteve presente a secretária-executiva substituta, Raquel Ribeiro Martins. Pelo Ministério da Igualdade Racial o secretário de Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana e Ciganos, Ronaldo dos Santos. O evento contou ainda com a participação do diretor da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Vinícius Carvalho Pinheiro, o presidente do Incra, Cesar Fernando Schiavon Aldrighi, a representante do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Forbela Fernandes, e Denildo Rodrigues Moraes, coordenador executivo da Conaq.

Pelo IBGE, além do presidente interino, Cimar Azeredo, estiveram presentes a responsável pelo Projeto de Povos e Comunidades Tradicionais do IBGE Marta de Oliveira Antunes, o Gerente de Territórios Tradicionais e Áreas Protegidas, Fernando Souza Damasco, o coordenador Técnico do Censo, Luciano Duarte, e as recenseadoras quilombolas Dandara Mendes, Joelita David Bitencourt e Gisely Cordeiro dos Santos, homenageadas no evento.

O chefe da Assessoria Especial do Ministério do Planejamento, João Villaverde, destacou ser a primeira vez que o território quilombola está dentro de um censo. Para ele, demorou e poderia ter sido antes, mas está acontecendo e a partir de agora a pesquisa estará sempre nos censos que virão.

“Em 2030, 2040, 2100 e todos os demais censos vamos comparar com o que está sendo feito agora. Em nome da ministra Simone Tebet agradecemos a todos os que participaram: a Fundação Palmares, ao Incra, ao Ministério da Igualdade Racial, à Conaq e ao IBGE. O IBGE é um patrimônio nacional, é a base para tudo que temos. Só sabemos a taxa de inflação, o quanto cresce a economia do Brasil, a taxa de desemprego e nossa renda, ou quanto somos, quem somos e onde estamos por causa do IBGE. Há dias que são de lutas, num país pobre e com tantas dificuldades como o Brasil, há dias que são de derrotas, mas tem dias que são de vitória. É muito bonito que estejamos descobrindo o território quilombola no dia do aniversário de Marielle Franco”, ressaltou o chefe da Assessoria Especial do Ministério do Planejamento, João Villaverde.

“Hoje é um dia de celebração em que o Brasil começa a resolver um pouco da sua história. Um país que não conhece seu povo, não conhece a sua história. Em nome da ministra Anielle Franco, quero parabenizar a todos que estão aqui. Não estamos divulgando novos dados sobre a população quilombola, mas mostrando que, para fazer política para o povo é preciso fazer com o povo. Por isso a Conaq foi tão importante. Essa semana celebramos o 25 de julho, Dia Nacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, o dia nacional de Tereza de Benguela, líder quilombola, e uma semana sensível, pois hoje seria o aniversário de Marielle Franco, uma líder pelos direitos humanos no Brasil”, afirmou a secretária-executiva do Ministério da Igualdade Racial, Roberta Eugênio.

A secretária-executiva substituta do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Raquel Ribeiro Martins, ressaltou o trabalho das coordenadoras da Conaq e do Incra, órgão executor da titulação quilombola em âmbito federal. “O trabalho desenvolvido pela equipe técnica do Incra, em parceria com o IBGE, foi imprescindível para a consolidação da base territorial do Censo Quilombola. É fundamental que os dados dessa população sejam continuamente monitorados, inclusive e especialmente no Censo Agropecuário”, destacou a secretária.

“É uma honra receber a comunidade quilombola, neste espaço dedicado a debater os avanços das questões agrárias, especialmente os povos remanescentes de quilombos. O Censo Quilombola é de uma importância enorme para a tarefa que o Incra tem de fazer. Precisamos falar de regularização fundiária”, disse o presidente do Incra, Cesar Fernando Schiavon Aldrighi.

“Dias como hoje são raros e históricos em 523 anos do Brasil. Esses dados tiram os quilombolas dos porões da invisibilidade da gestão pública. Precisamos colocar essas políticas no centro. Agradeço aos companheiros do IBGE e dos ministérios, e a cada liderança quilombola, que mesmo nas condições adversas seguraram o cajado na mão e muitas vezes fizeram o papel do Estado para massificar a informação para que os quilombolas recebessem o recenseador. O Censo para nós é uma conquista de anos de luta para que possamos avançar nas políticas públicas. Os dados vão servir como base para a Fundação Palmares e todos os ministérios relacionados aos quilombolas”, defendeu Denildo Rodrigues Moraes, o Biko, coordenador executivo da Conaq.

A representante do UNFPA, Forbela Fernandes destacou que os dados sobre os quilombolas representam um marco de reparação histórica importante e que serve de inspiração para outros países da diáspora africana.

“Essa é a primeira pesquisa oficial a comentar dados específicos sobre a população quilombola. Após 135 anos de abolição da escravidão no Brasil, finalmente sabemos quantas pessoas quilombolas existem, onde estão e como vivem. A incorporação da categoria quilombola e sua visibilidade estatística expressa o reconhecimento da diversidade da população brasileira e da luta histórica pela visibilidade. Este feito tem enquadramento nos manuais internacionais de direitos humanos, como o compromisso de não deixar ninguém para trás da Agenda 2030 e o compromisso contra o racismo”, ressaltou a representante do UNFPA.