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Censo 2022 em campo

Em Nova Iguaçu: Censo 2022 chega à área rural do Rio de Janeiro

Editoria: Séries Especiais | Daniele Souza | Arte: Brisa Gil

14/11/2022 10h00 | Atualizado em 16/12/2022 09h28

  • Destaques

  • Estado do Rio de Janeiro possui 2.626 setores rurais.
  • Equipe do IBGE acompanhou recenseamento em Jaceruba, na área censitária de Nova Iguaçu, que também abrange as subáreas de Queimados e Japeri.
  • Nova Iguaçu é a quarta maior cidade do estado, em termos de população. Junto a Japeri e Queimados, a região abriga mais de 1 milhão de pessoas.
  • Uma das maiores dificuldades em áreas rurais é o deslocamento.
Todos os dias, o recenseador Victor Paes caminha quilômetros, batendo de porteira em porteira, para encontrar os moradores, no bairro de Jaceruba - Foto: Daniele Souza/IBGE

Foi necessário esperar passar uma semana de muita chuva e lama, no início de outubro, para que a equipe de reportagem da Agência IBGE Notícias pudesse acompanhar a operação censitária num setor rural no bairro de Jaceruba, na Baixada Fluminense (RJ). De um lado, Japeri. Do outro, Nova Iguaçu. Uma curiosidade do local é que cada lado da rua pertence a um setor censitário e a um município diferente.

Pode ser difícil imaginar, mas existem setores rurais a 40 minutos do centro do município do Rio, em Nova Iguaçu, a quarta maior cidade em termos de população do estado. Somando os outros dois municípios vizinhos (Japeri e Queimados), a região abriga mais de 1 milhão de habitantes, divididos em 2.136 setores censitários – 135 deles, rurais. Ao todo, no estado do Rio, são 2.626 setores rurais.

“Em áreas rurais, o senso de comunidade é mais presente do que em áreas urbanas. E essa sensação de pertencimento é mais forte que os limites político-administrativos”, explica o coordenador da área, Felipe Feijó. “Dessa forma, é bem comum uma mesma comunidade com organizações sociais e áreas de convivência em comum estar dividida em municípios diferentes”, acrescenta.

Cafezinho, bolo e bicada de galo

Sítios e fazendas dominam a paisagem à beira da estrada. Na região, são comuns os moradores que sempre viveram em Jaceruba, como Manoel Mendes, o responsável pela primeira casa visitada no dia. “Quem respondia antes era o meu pai, já falecido. Agora já é a segunda vez que participo das pesquisas do IBGE”, comentou.

O próprio coordenador Feijó conhece todo mundo pelo caminho. Nascido e criado na região de Nova Iguaçu, ele já trabalhou em diversas áreas rurais no Censo 2022 e em outras pesquisas. “As maiores dificuldades estão relacionadas a acesso, com transporte público escasso ou ausente, além de estradas de difícil circulação”, enfatiza.

Ao encontro disso, o recenseador Victor Paes indicou a locomoção como a maior dificuldade. No setor, ele já tinha caminhado mais de 25 km para fazer 108 questionários: “Normalmente, não tem ônibus, o deslocamento tem de ser de transporte privado, mototáxi ou andando mesmo”.

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 O recenseador e o agente censitário supervisor na ponte sobre o rio São Pedro, que delimita a divisão: de um lado Japeri, de outro, Nova Iguaçu (foto) - Foto: Daniele Souza/IBGE
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Caminho em setor rural no bairro de Jaceruba, no município de Nova Iguaçu - Foto: Daniele Souza/IBGE
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Percorrendo a Estrada da Polícia, o primeiro entrevistado foi um trabalhador rural - Foto: Daniele Souza/IBGE
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Morador André Sales responde ao questionário do Censo 2022 - Foto: Daniele Souza/IBGE
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O morador Cláudio Luiz apresentou a plantação familiar, depois de responder às perguntas do Censo 2022 - Foto: Daniele Souza/IBGE
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Plantação de aipim no terreno do entrevistado - Foto: Daniele Souza/IBGE
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Todos os dias, os agentes do IBGE têm que andar pelos terrenos da área rural, em busca de casas "escondidas", onde podem encontrar outros moradores - Foto: Daniele Souza/IBGE
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O recenseador Victor Paes entrevista o morador Solano Gabriel - Foto: Daniele Souza/IBGE

Por outro lado, são muitas as histórias de receptividade da população. Morador chamando para tomar suco, comer bolo. “E muitos donos de estabelecimentos comerciais, como padarias, oferecem um café para mim, quando me veem indo e vindo, fazendo a pesquisa”, lembra Victor. “Além disso, o percentual de ausentes costuma ser mais baixo, pois sempre tem alguém em casa”, complementa Feijó.

Durante a coleta em um sítio, Feijó e o coordenador censitário da subárea, Jayme Luiz, testemunharam a agente censitária Monique Castro receber um pato da dona do local. “Ela queria dar o pato cozido, mas acabou dando o pato vivo mesmo”, explicou Jayme, que também já ganhou ovos caipiras e bolos diversos.

“A dona do sítio simplesmente gostou de mim. Nos locais onde passei, nem sempre as pessoas sabem o que é o Censo, mas elas entendem que é importante, são muito receptivas e sempre oferecem algo”, explica Monique.

Ao longo do trabalho na região, Jayme Luiz escutou diversas histórias de migração. “Era um local para onde as pessoas iam, em busca de tranquilidade. Devido à construção do Arco Metropolitano, muitos desses imigrantes se mudaram. Mas também é um local onde as famílias vêm passar o final de semana”, comenta, referindo-se às estradas do Arco Metropolitano do Rio de Janeiro, que liga as cidades de Nova Iguaçu, Queimados, Japeri, Itaboraí, Guapimirim, Magé, Duque de Caxias, Seropédica e Itaguaí. A casa que André Sales cuida é uma delas. Caseiro na residência da tia, diz que vem passar os finais de semana com a família. Uma propriedade familiar com cavalos e muitos peixes.

De acordo com Jayme, as curiosidades da região são muitas: fizeram recenseamento em um sítio onde todos os 16 filhos tinham o primeiro nome igual: “E eles disseram que nunca sairiam dali, plantavam o que comiam, não compravam quase nada”, contou.

Já ouviu falar sobre recenseador perseguido por cachorro? Com Victor, no setor rural, não foi bem assim. “Um dia, estava andando perto de um local com poucas casas e uma menininha começou a gritar algo para mim”. Antes que Victor pudesse entender, um galo pulou em cima dele e começou a bicá-lo: “Eu achei que ele tinha parado e a criança gritou 'ele está voltando'”. Resultado: uma calça toda furada pelo bico.

Para o superintendente da Unidade Estadual do IBGE no Rio de Janeiro, José Francisco Carvalho, a pesquisa rural tem suas diferenças: “Área grande, com porteira, sem ver o que há dentro, às vezes, com bichos. Mas uma coisa boa é que o Censo Demográfico 2022 está com a mesma tecnologia usada no Censo Agropecuário 2017, que mostra a rota e o trajeto do recenseador, com o georreferenciamento de domicílios e estabelecimentos, as coordenadas dos questionários onde os mesmos foram realizados”, pontua. “Isso evita erros e fraudes”, garante.

Plantações e rebanho

Para o Censo Demográfico, o que se chama de áreas de uso rural são locais caracterizados pela dispersão de domicílios e pela presença usual de estabelecimentos agropecuários. “Na área de Nova Iguaçu, além dos setores rurais, existem setores urbanos de baixa densidade e áreas de proteção ambiental”, esclarece Feijó. “Alguns municípios da Região Metropolitana abastecem as cidades com produtos perecíveis, como frutas, legumes e hortaliças. Também é possível encontrar pequenos rebanhos”, acrescenta.

De acordo com as pesquisas contínuas da agropecuária levantadas pelo IBGE em 2021, Japeri e Nova Iguaçu possuem rebanhos bovinos, suínos e galináceos, além de gerar produtos de origem animal como leite e ovos. Aliás, em 2021, Nova Iguaçu teve a maior produção de ovos de codorna do estado do Rio de Janeiro. Como produto das lavouras, Japeri e Nova Iguaçu cultivam banana, água de coco, laranja, limão e mandioca. Uma curiosidade é que o município de Nova Iguaçu já foi um dos maiores exportadores brasileiros de laranja, entre o final do século XIX e início do século XX.

Também é possível encontrar pequenas plantações familiares, como as de Cláudio Luiz. Embora tenha vivido em outros estados, voltou ao local de nascença, depois do falecimento do pai. Antes de convidar o recenseador para o almoço, Cláudio mostrou o maquinário e o cultivo de aipim e cupuaçu, que o pai tinha e ele manteve. “Achei muito fácil responder ao Censo; quando vi, já tinha acabado”.

Perto dali, bem na divisa entre os municípios, o recenseador Victor Paes também descobriu um “estabelecimento de outra finalidade”. De acordo com o Manual do Recenseador, Estabelecimento de Outras Finalidades é uma edificação utilizada para outros fins que não se enquadrem nas opções especificadas, como oficinas mecânicas, bancos, farmácias, escritórios, associações, lojas e comércio em geral. Era uma plantação coletiva, em área cedida pela dona do terreno.

Quem apresentou o local foi a moradora do outro lado da rua, Rogéria Rocha, que vive há oito meses no local: “Ela já tinha me abordado, querendo responder à pesquisa, mas ainda não havíamos chegado lá”, informa Paes.

Rogéria explicou que algumas pessoas plantam quiabo, berinjela, feijão e milho, para vender na feira que ocorre na região aos sábados. Ela também mostrou a chaya (planta semelhante a um espinafre) que cultivam e preparou um suco para o recenseador e o supervisor provarem, reforçando a típica hospitalidade da área rural.

Andando mais um pouco, depois da plantação coletiva, o recenseador encontrou uma casa com o morador Solano Gabriel: “Moro aqui desde criança, eu gosto e já estou acostumado com o local”. Não era a primeira vez que Solano respondia ao Censo. Para ele, é importante participar da pesquisa: “É uma forma de saber quem são as pessoas, quantas são, como vivem, para melhorar as políticas públicas”, resume.

Sobre Jaceruba

Jaceruba tem uma Área de Proteção Ambiental, criada em 2002, intitulada APA Jaceruba, na região noroeste de Nova Iguaçu, na divisa com Miguel Pereira e Japeri. O local também abriga a Festa da Banana, um dos produtos locais. Desde 2005, a festa gastronômica é celebrada, servindo iguarias feitas à base da fruta, no intuito de fortalecer o potencial turístico do local e reforçar a identidade rural da região.

Na região, também existe a Reserva Biológica do Tinguá, criada em 1989, para proteger o patrimônio natural da região, com mais de 26 mil hectares e diversas nascentes, em área de Mata Atlântica: “E o Censo ocorre aí normalmente, como em qualquer área rural. Eu tive o cuidado de ir em áreas dentro e ao redor da reserva, com um olhar atento, para verificar e não deixar passar nada. E encontramos moradores”, afirma Feijó.

Dentro da atual Reserva, o maciço do Tinguá foi um dos principais pontos de captação de água, para resolver a crise hídrica do Rio de Janeiro, no início do século XX, antes da captação de água do Rio Guandu.  Para transportar os operários que trabalhariam na construção da represa do Tinguá, foi construída a ferrovia Rio d’Ouro, que, posteriormente, passou a ser utilizada para transporte de passageiros. Depois, parte da sua linha, foi utilizada na construção da linha 2 do metrô do Rio de Janeiro.