Uso do Tempo
Seminário sobre uso do tempo debate o papel central da mulher na economia e no desenvolvimento do país
26/09/2025 14h31 | Atualizado em 26/09/2025 14h34

O uso do tempo foi o eixo central de debates e conversas na quarta (24) e quinta-feira (25), durante o Seminário Internacional Contando as Horas e Medindo os Cuidados, realizado na sede da Advocacia-Geral da União (AGU), no Rio de Janeiro. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi um dos organizadores.

Coordenado pela Comissão de Gênero do Instituto e pela Coordenação de Pesquisas por Amostra de Domicílios (DPE/COPAD), o seminário marcou um momento estratégico para o aprimoramento das estatísticas sobre uso do tempo no Brasil, como destacou o presidente do IBGE, Marcio Pochmann.
“O mundo está em novo movimento, com a mulher em destaque na vida econômica e social, e isso precisa ser mensurado e estudado. Por isso, é necessário que os dados sejam cada vez mais precisos, para que possam se transformar em políticas públicas”, afirmou.
Pochmann ressaltou o papel do IBGE nessa agenda: “Precisamos destacar o investimento nessa área, como a realização da POF [Pesquisa de Orçamentos Familiares], que traz dados sobre o uso do tempo. Ao contrário de outros institutos de pesquisa ao redor do mundo, que enfrentam cortes de investimento, nosso Instituto consegue mostrar a realidade brasileira e contribuir para a elaboração de ações.”

A secretária Nacional da Política de Cuidados e Família (SNFC/MDS), Laís Abramo, compartilhou esse pensamento e destacou a importância da participação do IBGE: “A informação detalhada é a chave para o desenvolvimento de políticas públicas mais justas, igualitárias e sustentáveis. Sem os dados, não somos capazes de dialogar com a academia, outros ministérios, o Congresso e organizações sociais.”

Representando o Ministério do Planejamento e Orçamento, Danyel Iório — subsecretário de Programas Sociais, Áreas Transversais e Multissetoriais e Participação Social — também falou sobre essa grande rede de informações voltada para a melhoria da vida da população: “Ter dados e informações de qualidade é trazer as necessidades para o debate, que gera orçamento e culmina em políticas públicas concretas.”

A programação contou com especialistas nacionais e internacionais. Luiza Nassif, codiretora do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das desigualdades (MADE/USP) e do Instituto de Economia da Unicamp, pontuou a importância de espaços de debate como este. “Trabalhar o uso do tempo é desafiador, pois se trata de um tema transversal, e o Brasil tem avançado na consolidação desses dados. Começamos aqui uma força-tarefa de mobilização para colocar a mulher no centro da economia e mostrar à população que ela também faz parte do processo de desenvolvimento do país.”

Pesquisas do IBGE captam o tema
Em 2009, o Instituto lançou uma pesquisa experimental dentro da PNAD Contínua, que já abordava a questão do uso do tempo e servia como base para um novo mapeamento, conforme informou a assessora da Presidência do IBGE e coordenadora da Comissão de Gênero, Daléa Antunes.
“O IBGE é o principal produtor de dados sobre esse tema. Fazemos perguntas sobre atividades e afazeres domésticos. Atualmente, estamos em campo com a PNAD Contínua, que inclui um novo bloco mais atualizado, e também coletando o teste do diário light da POF. Isso é importante porque não traz apenas informações sobre cuidados e afazeres, mas também sobre cuidados pessoais — o tempo que as pessoas dedicam às suas atividades ao longo do dia.”

Antony Teixeira, assessor técnico da Coordenação da PNAD Contínua, detalhou o novo módulo: “A atual pesquisa, em vigor desde 2016, é multitemática e investiga outras formas de trabalho.”
Quem está diretamente atento às mudanças nas famílias são os agentes de pesquisa e mapeamento. Gabriela Pires, da Superintendência do Rio de Janeiro, contribuiu em um dos painéis sobre o tema. “As perguntas sobre o uso do tempo e cuidados estão no último caderno da pesquisa, e percebemos nas visitas que a maioria dos lares é chefiada por mulheres.”
“Elas não têm percepção sobre o tempo e sua contabilização, nem associam os cuidados domésticos a formas de trabalho, neste caso, não remunerado. Inclusive, isso despertou em mim a observação da minha própria rotina em casa”, completou.

Oscar D’Alva, coordenador da PNAD Contínua na Superintendência do Ceará, reforçou a relação entre coleta de dados e formulação de políticas públicas: “Essas informações da PNAD e da POF auxiliam na articulação entre os ministérios e na elaboração de políticas públicas transversais.”
Realidade internacional sobre o uso do tempo
A realidade do Sul Global também foi um dos eixos tratados no evento. Valéria Esquivel, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), esteve presente e ponderou o uso do tempo como fator importante na elaboração de políticas públicas.
“As características dos países da América Latina fazem com que os questionários tenham especificidades locais. Por isso, existem diferentes metodologias, mas algo em comum: atividades diárias que ocupam a maior parte do tempo das mulheres. Com esses dados, somos capazes de traçar uma cronologia dos eventos, inclusive os realizados simultaneamente, e, com isso, observar a participação laboral e as desigualdades sociais entre homens e mulheres.”
Uma experiência criada há 30 anos, em Medellín, na Colômbia, foi apresentada por Iliana Vaca-Trigo, da Divisão de Estatísticas das Nações Unidas: “Também mapeamos por idade, classe social, tipo de moradia, além da utilização das 24 horas. Com esse detalhamento, somos capazes de fazer análises micro e macro, tornando o tempo uma unidade de medida para indicadores sociais e econômicos.”
Trazendo outro panorama da América Latina, Agustín Arce, do Instituto Nacional de Estatísticas do Chile, destacou a segunda pesquisa realizada pelo país sobre o uso do tempo.
“A última foi realizada em 2023, com pessoas a partir dos 12 anos. Constatamos que as mulheres gastam mais tempo em diversas atividades, sejam domésticas, remuneradas ou não. Questionamos por que muitas mulheres não tinham momentos de lazer ou estudo. A resposta foi: porque estavam trabalhando.”
