Salinas, a capital brasileira da cachaça artesanal
21/07/2017 09h00 | Atualizado em 31/07/2017 10h05
O município de Salinas, no norte de Minas Gerais, abrigou, no último final de semana, o Festival Mundial da Cachaça, realizado todos os anos, desde 2002. A cidade, conhecida como a capital nacional da cachaça artesanal, sedia cerca de 50 alambiques, 25 deles reconhecidos com o Selo de Indicação Geográfica do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
A cachaça, principal ingrediente de um drink tipicamente brasileiro, a caipirinha, ganhou reconhecimento desde que as bebidas fabricadas em Paraty (RJ) e em Salinas ganharam a certificação do INPI, em 2007 e 2012, respectivamente.
Cachaça de Salinas movimenta R$ 3 milhões por ano
A Associação dos Produtores Artesanais de Cachaça de Salinas (Apacs) tem, em seus registros, cerca de 50 empresas na região, 25 delas com selo regional. Segundo o presidente da Apacs, Eilton Santiago, essa economia movimenta em torno de R$ 3 milhões anualmente.
Há marcas com preços bastante acessíveis, como a Seleta (R$ 28,00), com uma produção anual de 2 milhões de litros por safra. Para a proprietária da marca, Renata Rodrigues, “o INPI é a certificação máxima que uma marca brasileira pode ter. O Selo de Identificação Geográfica distingue a região, é uma caraterística, significando que esse produto é dessa região por causa dessa caraterística”. Sobre a qualidade da sua produção, Renata enfatiza que “é um produto artesanal, mineiro. A gente consegue levar essa fama, essa qualidade do produto, para o país inteiro”.
Na outra ponta, estão as cachaças mais caras. É o caso da Havana (R$ 470,00), que tem uma produção que varia de dez a 14 mil litros por ano. Ibegeano aposentado, o produtor Geraldo Santiago, filho do fundador da Havana, Anísio Santiago, conta que o pai nunca quis produzir em grande escala. “A vida toda ele pensou em fazer pequenas quantidades e com qualidade superior. A Havana foi a primeira cachaça registrada, criou um certo nome e alavancou o nome da cachaça de Salinas para o país. É uma cachaça totalmente artesanal”.
Geraldo considera seu produto diferenciado por diversas razões: "a terra onde é plantada a cana, a qualidade da cana, o cuidado na fabricação, a arte de fabricar uma boa cachaça, e a arte de envelhecer. Só vendemos a cachaça em um alto padrão de qualidade". Ele explica que o envelhecimento de cachaças de alto padrão deve ser feito em dornas de madeira ou bálsamo, que precisam de muito tempo de uso. "Nossas dornas, a maioria delas, têm mais de 60 anos. Apenas dornas com 40, 50 anos estão em condições de envelhecer cachaça na qualidade da Havana", conclui.
Barris de madeira para envelhecimento de cachaça
O jornalista Dirley Fernandes, do site Devotos da Cachaça, explica que Salinas foi povoada por baianos, que levaram para lá a tradição da cultura cachaceira. A partir da década de 40, com a chegada do tropeiro Anísio Santiago ao local, Salinas começou a tomar o posto de Januária como produtor de cachaça de qualidade. Com a fama da cachaça Havana, outros produtores se juntaram, até mesmo da própria família Santiago, multiplicando as marcas.
Segundo Dirley, aquela região tem uma característica própria: “são cachaças que tiveram esse padrão de qualidade desde os anos 40, por conta do capricho e do cuidado em cada etapa de produção”. Ele considera que as cachaças de Salinas, além de terem esse padrão de qualidade altíssimo, são potentes, com um teor alcoólico mais alto e um sabor muito tradicional.
“Isso, que a gente chama de terroir, o método de produção, é que faz a diferença das cachaças de Salinas. Existem regiões produtoras tão boas quanto, mas não tem nenhuma região produtora de cachaça tão fértil e que multiplica tantas cachaças boas quanto Salinas”, constata Dirley
IBGE mapeia produtos com Selo de Indicação Geográfica
O IBGE, em parceria com o INPI, mapeou os Selos de Indicação Geográfica, localizando as regiões de origem de 49 produtos e serviços nacionais certificados por Indicação de Procedência ou por Denominação de Origem.
A Indicação de Procedência é o nome do local que se tornou conhecido por produzir, extrair ou fabricar determinado produto ou prestar determinado serviço. É o caso das cachaças de Salinas e de Paraty e dos queijos da Serra da Canastra, em Minas Gerais. O Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul, foi a primeira região a obter o Selo, em 2002.
Já a Denominação de Origem engloba a área que passou a designar produtos ou serviços, cujas qualidades ou características podem ser atribuídas a sua origem geográfica, como o café do Cerrado Mineiro ou os camarões da Costa Negra, no Ceará.
Recorte do Mapa das Indicações Geográficas do IBGE
Segundo o coordenador geral de Marcas e Indicações Geográficas e Desenhos Industriais do INPI, Marcelo Pereira, “esse tipo de registro dá uma visibilidade maior aos produtores e valoriza muito o produto. Quem compra tem a certeza de que o produto vem daquela região. Ele [o Selo] também garante que o produto passa por testes ou controles que um produtor somente não faria”.
Além do mapeamento, o IBGE e o INPI também têm um acordo de cooperação. Por ele, o IBGE é responsável por verificar se a delimitação da área geográfica informada pelas associações de produtores que pedem o registro no INPI é verdadeira.
Texto: Diana Paula de Souza e Karina Meirelles (estagiária)
Fotos:
Garrafas - Flickr Diogo Melo
Tonéis - Wikipedia