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Entrevista: Claudio Crespo vê IBGE presente durante toda a vida do brasileiro

Editoria: IBGE

25/09/2017 09h00 | Atualizado em 26/09/2017 19h06

A criação de grupos de trabalho temáticos, integrados por pesquisadores de diversas coordenações do IBGE, com um olhar interdisciplinar no planejamento e análise das pesquisas, será uma das inovações a serem implementadas pelo sociólogo Claudio Dutra Crespo, que ocupa a Diretoria de Pesquisas desde 15 de agosto deste ano. Ele assumiu esse cargo com o desafio de realizar, a partir de 1º de outubro, o Censo Agropecuário 2017, que coletará informações em cerca de 5,3 milhões de estabelecimentos rurais, e de implantar posteriormente o Sistema Nacional de Pesquisas Agropecuárias.

O trabalho mais colaborativo entre as áreas da Diretoria teve início com a criação do GT da Saúde, formado para apoiar a Pesquisa Nacional de Saúde e a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde, que traçarão, em 2018, um perfil atualizado das condições de saúde da população brasileira. Para avançar nas estatísticas sobre indígenas e quilombolas, será criado o GT de povos e comunidades tradicionais.

Outra diretriz destacada por Claudio Dutra é a de organizar e ampliar o sistema estatístico nacional, intensificando a parceria com órgãos nacionais produtores de informação. O objetivo é ter acesso a mais registros administrativos e possibilitar a sua utilização na produção de estatísticas. Na prática, o instituto oferecerá sua expertise para treinamentos na área de padronização, normatização de conceitos e tratamento das bases de dados. Além disso, reformulará o Cadastro Central de Empresas, para permitir a recepção de mais dados de outras instituições.

Sobre o Censo Demográfico 2020, Claudio Crespo conta que estão sendo realizados testes sobre cor e raça, deficiência e autopreenchimento do questionário. Um dos objetivos é avaliar a possibilidade de ampliar a coleta de informações pela Internet. Nesse sentido, o Seminário de Metodologia do IBGE, que ocorrerá em novembro, terá como temas os resultados do Censo Agropecuário e os preparativos e as inovações do Censo 2020.

No IBGE desde 2002, Crespo foi coordenador de População e Indicadores Sociais e gerente de Estatísticas Vitais e Estimativas Populacionais. Vinha exercendo interinamente o cargo atual desde que o antigo diretor de Pesquisas, Roberto Olinto Ramos, assumiu a Presidência do IBGE em junho. Graduado em Ciências Sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e Mestre em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense (UFF), tem experiência na área de sociologia, estudos populacionais e gestão da informação. Sobre a confiabilidade dos produtos do instituto, ressalta: “manter o padrão de qualidade conquistado ao longo dos anos é uma obrigação de quem assume a Diretoria de Pesquisas do IBGE”.

Agência IBGE Notícias: Quais são os seus planos a frente da Diretoria de Pesquisas? 

Claudio Crespo: Em primeiro lugar, manter o padrão de qualidade do IBGE, conquistado ao longo dos anos, é uma obrigação de quem assume a Diretoria. Para avançar nesse aspecto, estamos nesse momento treinando, também, pessoas das unidades estaduais para que haja uma participação integrada do IBGE no mapeamento dos processos e na reformulação das nossas operações. O objetivo é estabelecer as melhores práticas no que se refere à qualidade da produção estatística. Segundo, do ponto de vista da gestão, objetiva-se estabelecer trabalhos mais colaborativos internamente, entre as diversas coordenações da diretoria de Pesquisas. Já começamos isso na área sociodemográfica, onde vamos institucionalizar grupos de trabalho temáticos. Como o trabalho é cada vez mais interdisciplinar, necessitamos de uma organização para além da estrutura formal.

O grupo de trabalho (GT) da área de saúde, por exemplo, ajudará a diretoria no planejamento da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) e da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde, que será um grande desafio do IBGE para 2018, em parceria com o Ministério da Saúde. Assim, passamos a utilizar mais os saberes dos técnicos que estão espalhados pelas diversas áreas. Essa é uma forma de gestão que queremos efetivar até o final de 2017 para dar conta do planejamento e também da análise das pesquisas: estimular a representação nos grupos de trabalho em que o IBGE tem participação, no nível nacional e internacional, além de aprimorarmos a parceria com técnicos que estão nas unidades estaduais. Por exemplo, contamos com um servidor da unidade estadual de Rio Grande do Norte, que é doutor em saúde pública, e que vai aportar seu conhecimento ao grupo de trabalho da saúde. Assim, esse conhecimento que está espalhado pelo Brasil vai ser, de certo modo, usufruído no planejamento das pesquisas e, no futuro, nas análises.

Outro exemplo é um GT, cujo tema será Povos e Comunidades Tradicionais, que ajudará o IBGE a avançar nas informações desses segmentos da população. O GT sobre povos e comunidades tradicionais aprofundará o trabalho que teve um sucesso significativo nos resultados do Censo 2010 para povos indígenas. Estamos, atualmente, discutindo conceitos que permitam ampliar o conhecimento sobre quilombolas. Nesse caso, tem uma profissional do IBGE, que é da Unidade Estadual do Maranhão, que também será incorporada ao GT, dado o seu conhecimento sobre esse tema. O trabalho colaborativo vai organizar o conhecimento e fazer avançar essas temáticas, independentemente da coordenação formal em que o técnico esteja lotado, evidentemente sem abrir mão das funções que desempenha na sua área. É uma forma de organização do tempo e do trabalho e, também, um estímulo ao servidor, ao técnico, porque ele estará colocando a serviço do IBGE e do Brasil aquilo que ele aprendeu, e a respeito do qual é uma liderança temática dentro do IBGE. Com isso, a gestão no IBGE ganha em soluções para diversas questões.

Temos outros desafios de reformulação decorrentes do nosso trabalho. Por exemplo, a partir da coleta do Censo Agropecuário, que se iniciará, em 1º de outubro, e da divulgação dos primeiros resultados, prevista para junho 2018, vamos começar a implantação do Sistema Nacional de Pesquisas Agropecuárias, ou seja, definir a amostra do que será esse novo sistema. Na área das pesquisas por empresas, também estamos com o desafio de unificar o questionário e os processos das pesquisas estruturais (comércio, serviços, indústria e indústria da construção). Esse projeto tem a mesma grandiosidade da implementação do Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares (SIPD) . 

Agência IBGE Notícias: como os dados administrativos podem contribuir para a produção da estatística? 

Claudio Crespo: Os registros administrativos do Brasil têm tido avanços significativos e podem fornecer informações com diversos recortes geográficos e menor periodicidade, o que são demandas cada vez mais comuns. Então, os GTs que estamos criando vão olhar a viabilidade de cada uma das fontes de dados administrativos, e o IBGE vai intensificar o seu trabalho de parceria com órgãos nacionais produtores de informação, para que haja acesso aos registros administrativos e seja possível fazer vinculações e utilizar essas informações para produção de estatísticas. Por exemplo, um dos projetos que a Diretoria vai dar maior impulso é justamente a reformulação do Cadastro Central de Empresas, porque ele permitirá, receber e se comunicar com registros administrativos de outras instituições.

Outra diretriz será organizar e ampliar o sistema de informação nacional.  Oferecendo nossa expertise em padrões, em metadados, o IBGE poderá colocar à disposição de outras instituições treinamento para que essas bases de dados possam de fato se comunicar, ou seja, na área de padronização, normatização de conceitos e tratamento das bases de dados. Atualmente, o Brasil tem grande produção de dados, cada setor produz uma quantidade muito elevada de informações, mas há carência de normatização, de harmonização de conceitos. Então, esse é um aporte de conhecimento que o IBGE está se preparando para oferecer aos outros órgãos que deverão compor o Sistema de Informações em âmbito Nacional.

Esse dado precisa ser mais qualificado. Os registros administrativos foram produzidos para atender à necessidade administrativa de cada serviço, não foram pensados, na sua origem, para dar conta da produção de estatística, mas cada vez mais, aqui no Brasil e no mundo inteiro, se entende que essa fonte precisa ser mais explorada. Para que ela tenha essa função, é necessário qualificá-la, e o IBGE está dando passos nesse sentido. A forma que o IBGE iniciou esse processo é qualificando seus metadados. Usando exemplo interno, poderemos oferecer esse serviço a outros órgãos. Com isso produziremos possibilidade de compartilhamento, respeitando todas as regras do sigilo de informações.

Agência IBGE Notícias: Quais dados disponíveis no registro administrativo seriam úteis para o IBGE?

Claudio Crespo: Um dado fundamental é o do registro do imposto de renda de pessoas jurídicas, que possibilitaria um grande avanço na produção de estatísticas da área de empresas e contas nacionais. Outro exemplo é a área de registro de imóveis, tendo o IBGE acesso a esses registros ele pode avançar na produção de um índice de preços de imóveis. São exemplos de grande importância e relevância para a economia. Mas a área social também: por exemplo, registros de estabelecimentos de saúde sendo absorvidos no nosso cadastro de empresas nos permitirão também uma melhor qualificação; fazer pesquisas que hoje são por universo de forma amostral ou por algum recorte específico. É o caso da Pesquisa de Assistência Médica e Sanitária. Certamente, tendo uma atualização a partir do cadastro de estabelecimentos de saúde, poderíamos fazer pesquisas mais pontuais e com respostas mais rápidas.

Agência IBGE Notícias: Como o IBGE pensa em equilibrar a produção com a utilização dos dados pela sociedade?

Claudio Crespo: Hoje, o IBGE tem em suas divulgações um conjunto de indicadores básicos para apresentar cada resultado que ele produz. A ideia é que a gente avance para ter um sistema de indicadores, socioeconômicos, demográficos, ambientais, e esse conjunto de indicadores permita à sociedade leituras mais rápidas e mais amplas da realidade social. Isso significa passar de uma síntese de indicadores, sem deixar de produzir relatórios, para um sistema de indicadores que seja alimentado pelas pesquisas. Já vínhamos, também, trabalhando, desde o ano passado, em algumas publicações como as da série estudos e análises, que visam dar um panorama nacional e internacional de indicadores sociais. Fizemos sobre família, sobre trabalho, entre outros, que dão um espectro de indicadores e de construção dessas informações. 

A quantidade de informação produzida pelas pesquisas é muito grande. A obrigação que temos na produção regular de informações tomam boa parte do nosso tempo, mas a cada publicação estamos buscando oferecer informações mais qualificadas: seja nos produtos já existentes ou em alguns cadernos que pretendemos lançar no próximo ano. Estamos trabalhando em um caderno específico sobre indicadores de gênero que será lançado no próximo ano.

Agência IBGE Notícias: A gente escuta bastante nos fóruns que existe a necessidade da regionalização da informação, da informação local para gestão pública, mas por outro lado é necessário harmonizar internacionalmente as informações. Como a Diretoria de Pesquisas pode equilibrar esses esforços de regionalização e globalização?

Claudio Crespo: Há, por exemplo, um processo de discussão internacional dos indicadores globais para medir os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU. A Comissão Nacional, que foi instalada pelo governo brasileiro, será responsável pela condução da definição de indicadores nacionais também. Então, a agenda dos ODS está pensada globalmente, mas também regionalmente, ou seja, como calcular indicadores para cada uma das metas olhando as realidades dos estados e municípios brasileiros. É uma agenda que busca uma interação global e regional. É claro que alguns indicadores são mais apropriados a algum estado ou a algum município que outros. Então, o IBGE estará inserido através de 17 grupos e fazendo esse papel de assessoramento da comissão nacional.

Agência IBGE Notícias: Quanto a sociedade está disposta a pagar pela estatística? Como o IBGE pode defender esse investimento em uma sociedade onde há carência de recursos em áreas básicas? 

Claudio Crespo: O valor das estatísticas vai muito além do custo financeiro. À medida que um dado é produzido pelo IBGE, como a taxa de desocupação, que faz parte da preocupação da população brasileira, explorar esse uso diário é uma forma de demonstrar esse valor. Olhando do ponto de vista do impacto dessa presença diária das informações produzidas pelo IBGE para cada brasileiro, nosso custo é muito pequeno. Na verdade, o IBGE tem uma produtividade elevada, porque nós estamos retratando o dia a dia da população. Eu costumo dizer que do nascer ao morrer a vida passa pelo IBGE. Então, o IBGE está lá obtendo as informações sobre os nascimentos, as informações sobre casamentos, sobre as condições de vida das famílias, sobre a inflação, que é uma realidade presente na vida de todos nós. Produzimos informação sobre a tecnologia, sobre desenvolvimento e desempenho das empresas, da economia brasileira. Nós retratamos a vida, o dia a dia do brasileiro. Esse investimento que a sociedade brasileira faz no IBGE através do orçamento público tem o retorno diário. Como seria se não tivéssemos conhecimento da taxa de desocupação? E se não soubéssemos quantos brasileiros vivem em domicílios sem renda do trabalho? E se não tivéssemos conhecimento da importância dos benefícios sociais, quando as crises econômicas ocorrem e o emprego fica mais escasso? Como seria a vida sem essa informação? Então, é ai que a gente também revela a importância do IBGE. O IBGE é vital, é como respirar.

Agência IBGE Notícias: O Censo 2020 já começou? 

Claudio Crespo: O Censo 2020 já começou. A gerência responsável pelo censo demográfico fez um balanço do Censo 2010, do que a gente pode avançar. Estamos observando as recomendações internacionais, fizemos algumas visitas técnicas a outros institutos para ver os avanços, em especial dos aspectos de uso da internet. Também fizemos testes para informações de territórios quilombolas, que é um aspecto que precisamos conhecer.  Esse trabalho é em parceria com a Diretoria de Geociências. Estamos atentos para discutir os temas clássicos de uma operação censitária, como a fecundidade, a migração, com a preocupação de oferecer informação qualificada , atentos ao tamanho do questionário. O último Censo foi a 65 milhões de domicílios. Então, precisamos ser objetivos, muito claros nas perguntas, pois o questionário brasileiro é um dos maiores do mundo.

O Seminário de Metodologia do IBGE, que ocorrerá em novembro, terá os Censos como tema. Discutiremos como nos apropriaremos dos resultados do Censo Agropecuário e sobre os preparativos e as inovações do Censo 2020.

Agência IBGE Notícias: Como é a interação entre a pesquisa estatística e as geociências?

Claudio Crespo: É cada vez mais necessária. O IBGE tem isso na sua origem, mas estamos aprimoramento essa interação. A análise espacial é uma ferramenta cada vez mais importante, pois o espaço informa muito sobre a realidade. Aspectos estruturais que, às vezes, não podem ser captados diretamente pela pergunta ao indivíduo, o espaço pode responder e muito. As pesquisas ou censos não podem ser pensadas sem essa interlocução. Então, essa aproximação vai ser cada vez maior.

Entrevista: Adriana Saraiva e Marcelo Benedicto (colaborou Francisco Alchorne)
Fotografia: Licia Rubinstein