Nossos serviços estão apresentando instabilidade no momento. Algumas informações podem não estar disponíveis.

Entrevista: Roberto Olinto fala sobre o desafio de presidir o IBGE

Editoria: IBGE

22/08/2017 09h00 | Atualizado em 21/12/2017 15h32

Censo Agropecuário, Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), integração de registros administrativos e criação de um Sistema Nacional de Informações. São estes os principais desafios que o novo presidente do IBGE, Roberto Olinto Ramos, há dois meses no cargo, vai enfrentar em sua gestão.

Carioca de Copacabana, morador da Lagoa, Olinto, aos 64 anos, é casado com a jornalista Amélia. Tem três filhos, uma neta e duas enteadas. No IBGE desde 1980, Olinto assumiu a Diretoria de Pesquisas do instituto em agosto de 2014.

Em nossa entrevista, ele conversou sobre estes e outros temas e disse que nunca havia pensado em ser presidente do IBGE.

Agência IBGE Notícias – O senhor esperava ser indicado à Presidência do IBGE?

Roberto Olinto – Eu nunca pedi cargo no IBGE. Eu não acho a ascensão uma necessidade. Ser presidente do IBGE, eu nunca pensei muito nisso não, pois sempre trabalhei na área técnica. Agora, nesse final, quando o Paulo [Rabello de Castro, ex-presidente do IBGE] foi indicado ao BNDES, a possibilidade de ser indicado era clara. Mas eu não tive muito tempo de pensar. Eu tive um dia. Foi muito rápido. E na Diretoria de Pesquisas ainda tem muita coisa para fazer, apesar de que quem ficou lá é ótimo [o cientista social Claudio Crespo].

Agência – Quais os desafios que o senhor terá que enfrentar na Presidência do IBGE?

Olinto – Tem alguns desafios muito claros. Temos duas grandes operações: a POF e Censo Agropecuário, este último com condições de orçamento restritas e que tem que ser planejado com muito cuidado. Nós temos um cronograma apertado. Apesar de ter havido redução do questionário do Censo, isso não quer dizer que tenhamos resolvido todos os problemas.

Mas eu acho que o grande desafio do IBGE é aproveitar esse momento para dar um salto de modernização. Não no sentido de passar do velho para o novo, mas de se adaptar ao que hoje os institutos de estatística do mundo inteiro estão trabalhando, que é usar os registros administrativos na produção de informação.

Agência – O que isso significa?

Olinto – Significa integrar os diferentes produtores de informação. Há órgãos no governo que produzem informação e essa informação, em alguns casos, é duplicada, ou não é usada, ou não é disponível. Então, tem todo um processo de modernização do sistema de informação. No Brasil, o IBGE seria o coordenador e pretendemos chamar os produtores para discutir um projeto de um Sistema Nacional de Informações.

Agência – O senhor pode exemplificar?

O meu exemplo típico, obsessivo, são as informações fiscais do país. A gente pergunta numa empresa duas vezes a mesma coisa, o IBGE e a Receita Federal. Tem que liberar também, por exemplo, as questões de registro civil. Tem que começar a pensar na integração das questões ambientais. Nós temos que desenvolver informações que nos permitam ir mais detalhadamente nas questões de estados e municípios.

Quer dizer, você pode ter alguns produtores de informação, mas seus dados não são integrados numa rede. A ideia é que essa informação seja pública, transparente, numa rede onde as pessoas sejam orientadas na busca dessa informação.

Agência – O IBGE seria o gestor desse sistema nacional de informações?

Olinto – O papel do IBGE é o papel de coordenação e as outras questões nós gostaríamos de colocar num fórum de discussão. A organização, as responsabilidades e fronteiras, isso faz parte de todo um processo. Hoje você tem os indicadores de desenvolvimento sustentável como uma oportunidade para discussão no Brasil. É uma boa oportunidade para que se possa começar esse sistema de informações, um bom momento para essa discussão.

Agência – Esses registros administrativos são confiáveis no Brasil?

Olinto – Sim, os registros administrativos do Brasil são confiáveis. O problema é a liberação de acesso, proteger o sigilo e a privacidade dos informantes. Mas, repito, não tem sentido o IBGE bater na porta de uma empresa e perguntar coisas que o governo já pergunta.  É uma discussão que deve ser considerada de uma forma mais clara, no sentido de que, se a gente quer melhorar, os feudos não podem ser mantidos.

Agência – O orçamento do Censo e da POF no próximo ano está garantido?

Olinto – A informação que eu tenho é que o governo considera que, a partir do momento que houve um investimento de, aproximadamente, R$ 500 milhões no Censo Agro esse ano, e é uma operação que tem uma evidência forte e uma necessidade para o país, mesmo com o texto análise reduzido, é uma operação chave. Eu não consigo imaginar que se vá ignorar que já se iniciou o trabalho e não ter orçamento para tal.

Tem a área acadêmica preocupada com o Censo, tem todos agentes produtivos, que envolvem o agronegócio, e várias outras cadeias que usam as informações. Tem também toda a área social, extremamente importante, pois o Censo vai cobrir agricultura familiar. E as pessoas já se conscientizaram de que o Censo é um avanço para um sistema de informações, que chamamos de Sistema Nacional de Pesquisas Agropecuárias, que permitirá começar a produzir pesquisas por amostragem, a partir a base de cadastro que o Censo está montando. É um avanço nessa área de produção de pesquisa agropecuária.

Agência – Em relação às discussões que surgiram após a divulgação das primeiras versões do questionário do Censo Agro, mais reduzido que nos Censo anterior, houve alguma alteração?

Olinto – O questionário começou de uma forma embrionária. Foi colocado em discussão, não só internamente no IBGE, mas também com outros usuários. Ele foi gradativamente ampliado, com a discussão sobre a inclusão ou não de algumas informações. Em algumas dessas questões, considerou-se que se poderia fazer uma pesquisa posterior para detalhar e, considerando o prazo que tínhamos, não podíamos mais  deixar  o questionário em aberto a partir de um determinado momento. Fazer o planejamento, o desenvolvimento do sistema, a carga das imagens, a conta dos domicílios , a contratação de pessoal, isso tudo tem um cronograma pesado. Já estamos na fase de operação, de efetiva realização do Censo.

Agência – Estamos vindo de um momento em que o IBGE sofreu sistematicamente com cortes no orçamento, que inviabilizaram grandes operações. Foi o caso da Contagem da População, que não foi feita em 2015. O próprio Censo Agropecuário foi adiado e a POF também. Tem alguma forma de garantir a periodicidade dessas pesquisas? O senhor está pensando em alguma coisa desse sentido?

Olinto – Isso é um problema eterno no IBGE, não é de hoje. Existem muitas formas de lidar com essa situação. A forma que eu acho mais interessante é que se estabeleça um plano estatístico no país, em que se defina claramente – e definir claramente é sempre dubio, porque o Censo, pela lei, não ia conseguir orçamento –, dentro de um plano de estatísticas, as grandes operações.

O outro caminho é avançar com o sistema, através de operações mais baratas e mais intensas. Um exemplo são as pesquisas que fizemos com empresas depois de 1990, quando extinguimos o Censo Econômico e começamos a desenvolver as pesquisas anuais, como as da indústria, comércio e serviços. Não estou dizendo que é a solução, mas um caminho para que se possa refletir.

O fato de não ter liberado o orçamento da Contagem afeta seriamente a estimativa populacional, que precisava da Contagem, e afeta a distribuição do FPM [Fundo de Participação dos Municípios]. Certas grandes operações, elas não são necessárias somente para ter o conhecimento e retratar o Brasil, como também para balizar decisões de politicas que são muito concretas, como o fundo de participação.

Agência – E os preparativos para o Censo 2020?

Olinto – Já começaram. Já está se discutindo orçamento para começar a organizar a operação. Não acredito que vá atrasar. Entre outras razões, além de toda a importância do Censo Demográfico para o país, é uma das poucas informações em que se cobre o nível de município. Hoje existem compromissos internacionais para o desenvolvimento sustentável. Então, a óbvia necessidade de ter um Censo Demográfico não permite muitos questionamentos. O Censo, qualquer que seja o orçamento dele, é barato para o que ele traz.   A quantidade de informação e a possibilidade de conhecer esse país é muito grande. Na minha cabeça é impensável não ter um Censo.

Entrevista: Diana Paula de Souza
Colaboração: Luiz Bello e Karina Meirelles (estagiária)
Fotos: Licia Rubinstein